
É
inegável sob todos os aspectos, de que vivenciamos na igreja evangélica de
nossos dias e em nosso país, uma crise espiritual que afeta de forma inequívoca
a integridade bíblica que lhe deveria ser peculiar.
Contemplamos estarrecidos
as bizarrices e desvios doutrinários que foram introduzidos na Igreja e
perguntamos: A falta de saúde da igreja evangélica brasileira não estaria
relacionada à uma prática hermenêutica enferma? O que contemplamos no cenário
eclesiástico evangélico acaso não aponta para um doente na UTI (a Igreja) que
precisa de rápidos e atentos cuidados para que ela recupere em tempo sua
vitalidade bíblica? É sobre isso que discorreremos a seguir.
Nunca
foi intenção de Deus de que Seu povo em todas as épocas da narrativa bíblica,
ficasse sem Sua orientação e cuidado. Desde o Éden, passando pelos patriarcas
hebreus, na formação da nação israelita e no período monárquico, após o exílio
e chegando aos tempos neotestamentários, o Senhor procurou conceder aos Seus
servos a segurança e firmeza de estatutos e mandamentos que lhes
proporcionassem uma espiritualidade sã. Sua revelação proposicional contém em si
mesma a vitalidade necessária que, em todas as épocas da história do povo de
Deus balizou a relação com o Todo-Poderoso.
É
aqui que que se compreende a necessidade de que os cristãos precisam
interpretar corretamente a Palavra que lhes foi revelada visto que ela mesma
atesta que há pontos de difícil interpretação (2Pe 3.16). Por isso mesmo, a
Igreja na contemportaneidade, mais do que em todas as épocas antecedentes,
tendo em suas mãos o cânon em sua forma final, precisa de um modelo de interpretação
bíblica capaz de levar o cristão a compreender o sentido original pretendido
pelos autores bíblicos.
Não
é uma tarefa leve. Tampouco é uma tarefa como outra qualquer. Especialmente em
se tratando da revelação divina, as palavras de Deus outorgadas a mais de
quarenta autores no decorrer de muitos séculos, urge que o cristão compreenda
que são palavras divinas veiculadas em três idiomas humanos diferenciados
(hebraico, aramaico e grego) incluindo aí igualmente as formas gramaticais, as
figuras de linguagem, os tipos de textos tais como poesia, história, profecia,
etc. . Há abismos reconhecidos para a compreensão da Palavra de Deus e eles
podem ser cronológicos, geográficos, culturais, literários, linguísticos e
destacaria dentre estes, o abismo espiritual ou sobrenatural visto que, embora
escrito em linguagem humana por autores humanos, o Livro é de Deus, um Ser
infinito e que não pode ser plenamente compreendido por seres finitos.
A
interpretação portanto, de um compêndio dessa magnitude não pode ser leviana a
ponto de se mistificá-la, com a tentativa vã de se encontrar “sentidos ocultos”
em seu texto. Aqui estamos a repudiar a alegorização, a intuição, ou ainda uma
interpretação existencialista que rejeita e mistifica a sobrenaturalidade
fortemente presente nas narrativas bíblicas. Igualmente digna de rejeição são
as interpretações de cunho humanista que, além de menosprezarem os milagres
bíblicos, demonstram pela Bíblia somente um interesse literário e acadêmico.
Também não se pode deixar de frisar a metodologia histórico-crítica que
racionalizou sua hermenêutica a tal ponto que veio posteriormente a dar origem
ao liberalismo teológico onde o predomínio não é da revelação sobre a razão,
mas sim da razão sobre a revelação escrita de Deus.
Todas
essas correntes há pouco resumidamente descritas farão com que a Igreja padeça
de enfermidades espirituais que a descaracterizarão e que por fim podem lhe ser
fatais.
Falamos
anteriormente que Deus nunca deixou de se revelar ao Seu povo. E se Ele assim
agiu, é certo que Ele mesmo trabalhou providencialmente para que um método
único e verdadeiramente adequado fosse utilizado, que não corteja os extremos
do misticismo ou do racionalismo e que se aplicado devidamente vai gerar sáude
e vitalidade nas vidas dos cristãos e na fraternidade da Igreja. Falamos do
método histórico-gramatical de interpretação das Escrituras. Seus princípios
são linguística e historicamente coerentes assim como o caráter divino-humano
das Sagradas Escrituras. Ela foi usada de maneira plena pelos reformadores que
assim puderam repudiar veementemente a interpretação alegorista medieval da
Bíblia. Outrossim, houve igualmente o destaque da importância fundamental da
pessoa do Espírito Santo na interpretação bíblica em seu papel de iluminar o intérprete
na compreensão das Escrituras.
Os
idiomas originais passaram a ser devidamente considerados e estudados bem como
a análise histórico-cultural dos textos bíblicos analisados. Convém frisar que
este é um método que exigirá do intérprete e estudioso a dupla consideração
perene de que, ao tratar de um livro que é divino-humano, ele haverá de manter
uma atitude de oração e santo temor e trabalhar arduamente no entendimento do
texto. O Espírito Santo vai iluminá-lo enquanto ele busca o “sensus plenior” (sentido
pleno) da passagem em apreço diante de si.
Ora,
isto é completamente diferente da pura mistificação no trato com as Escrituras
ou à racionalidade esterelizante e tendente à incredulidade.
Portanto,
creio na relação estreita entre o método hermenêutico histórico-gramatical que
pelas suas características levará a uma exegese textualmente adequada e a uma
prática de vida de fé que expressará a vontade do Deus Trino gerando assim uma
Igreja cristã plena de bons frutos e saudavelmente bíblica.
Nosso
país carece de igrejas com essa têmpera, solidificadas na fé, com uma teologia
salutar e com uma pregação que veicule o autêntico Evangelho. Tudo isto só irá
se sobressair se o método histórico-gramatical de interpretação tiver o seu
devido e merecido lugar no trato que os homens e mulheres de Deus tiverem com
as Escrituras, na diligência empregada no estudo do texto e contexto histórico
e na confiança na ação iluminadora do Espírito de Deus.
Pense nisso ....